No capítulo Gravações, em Falei com Da Vinci, uma historieta de três páginas, faz referências diretas ao livro Vida e Morte de M.J. Gonzaga de Sá de Lima Barreto, e a alegoria de abertura, “O inventor e a aeronave”.
Nesta obra, Lima Barreto, apresenta um eu que é manipulado por um sujeito que também se apresenta duplicado: um eu que se põe dentro da ficção, mediante a condição de autor implícito, e outro – o autor real – que cria a obra. Este embuste ficcional conserva o jogo dialético e a tensão entre a voz do autor e a voz do narrador, entre o enunciado e a enunciação. Através desse truque de autoria, o autor/real se exime de assumir a autoria do relato, pois inventa um narrador intermediário. “O inventor e a aeronave”, é um texto metalinguístico, que expõe dois níveis da criação: da representação e da estruturação da narrativa, que se fundamenta na arte do fazer literário.
Em Falei com Da Vinci, o autor busca um resultado digamos, ‘quase’ semelhante por caminhos diferentes. Visto que o eu-autor-real se manifesta logo no 'Aviso', declarando a narrativa como experimento de leitura e também de forma implícita do eu-poeta que se manifesta durante toda narrativa através de belas metáforas e associações. E o autor-narrador-fictício, que se revela no penúltimo capítulo, 'Na Persona'. Neste capitulo o autor-narrador-fictício toma consciência da sua condição ficcional, como personagem no processo da Imaginação Ativa. Ao assumir sua existência no mundo da ficção, passa a existir como coautor do livro. Para desatar o provável nó, na sua cabecinha, observe a imagem abaixo:
Num primeiro momento em Falei com Da Vinci, o contexto de realidade do personagem principal é vivido através de suas memórias, num enredo tipicamente pertencente ao realismo fantástico. Num segundo momento, a amnésia psicogênica coloca essa realidade em xeque, como não vivida, mas fruto criativo do personagem-narrador como identidade de escritor. No terceiro momento, o processo da Imaginação Ativa torna o personagem-narrador em personagem-escritor-fictício com potência para existir como representação, e num último momento como estruturação do fazer literário, esse personagem se torna um hibrido de coautor-autor. Deixando no leitor, a péssima sensação de ter perdido algo. Isso ocorre, porque não estamos acostumados a ver ou imaginar as coisas de dentro pra fora... Por ser uma leitura que flui, temos a sensação de afunilamento dos eventos, quando na verdade, ocorre uma expansão. Como diz o hermético personagem Mestre: É dentro dos nossos olhos e ouvidos que a magia acontece! Olhe novamente para imagem acima, e experimente imaginar que você está pintando! Você está na frente do quadro, pintando. A magia, é que se você é o pintor, você não aparece, você não vê seu rosto, lembre-se, você está pintando! No caso, escrevendo ou lendo...
Prof. José S. Queiróz