Um interstício na voz da Caipirinha



“...
- É! O senhor conhece o Peidão?!
- Não, não conheço. Por favor, continue.
- Foi o senhor qui causo o interstício.
- Interstício?
- Foi. Não foi?
- Foi. E sua amiga?
- Ondi eu tava memo?
- No Peidão!”  (Falei com Da Vinci – pág.49)

A forma como falamos carrega vários indícios de quem somos. É por meio da fala que podemos perceber nosso lugar de origem, a faixa etária, o gênero do falante e até mesmo os grupos sociais que frequentamos.

Levar em conta apenas a norma culta da língua, ignorando qualquer fenômeno linguístico que não seja condizente com ela é algo muito comum nas Academias de Letras, editoras e nos currículos escolares. A partir dessa visão equivocada, origina-se o chamado preconceito linguístico. Assim como todo preconceito, trata-se de um pré-julgamento de caráter discriminatório. Nenhuma das línguas faladas no mundo segue todas as convenções linguísticas que as normatizam.

Sendo viva, a língua modifica-se de maneira transversal e atemporal conforme seus falantes. De forma natural as variações e mudanças aumentam a distância entre os usos linguísticos reais e as formas normatizadas, padronizadas, eleitas como modelares. A gramática normativa apenas dita regras sobre uma determinada língua, mas jamais, em hipótese alguma, deve ser utilizada como a única teoria linguística válida. Não podemos ignorá-la por completo, assim como não podemos aceitar que se seja objeto de exclusão social.

Para falar e escrever bem, não precisamos necessariamente ser grandes estudiosos da gramática; precisamos ter contato com a língua padrão, falada ou escrita, para que consigamos internalizar seu conteúdo. Saber gramática, pode ser um elemento importante para que consigamos nos comunicar melhor, mas não uma exigência para tal. Devemos entender ‘variedades e diferenças’ como algo que a enriquece, jamais como um fator de exclusão.

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